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O grande maestro: nosso cérebro

Atualizado: 8 de mar.


A arvore e as ramificações do cérebro

Algumas coisas estão tão próximas de nós que, muitas vezes, acabam se tornando invisíveis. O nosso próprio organismo é um desses exemplos. A maior parte do tempo, ele passa completamente despercebido. Só lembramos quando estamos sentindo alguma dor ou por causa de uma doença. Não falamos aqui dos especialistas que estudam as diversas áreas relacionadas ao nosso ser físico. Falamos aqui do comum dos mortais.

 

O que conhecemos sobre as estruturas ou os sistemas que formam o nosso corpo? O que conhecemos da organização de todos esses elementos constitutivos do nosso ser? Quando perguntamos para as pessoas de quantos músculos, ossos, sistemas é formado o organismo humano, muitas ficam surpresas em não saber responder. Sobre nosso cérebro então, ele é ainda mais ignorado. Por quê? Por que algo tão próximo fica invisível aos nossos olhos? Será que a intimidade com nós-mesmos nos causa medo e preferimos criar uma “membrana” de proteção? Preferimos não saber? Temos medo de nos conhecer?  Temos receio de nos confrontar com essa imensa complexidade? Ou simplesmente não queremos assumir a responsabilidade desse conhecimento e preferimos deixar nas mãos dos especialistas do assunto?

 

Conhecer não é próprio do ser humano? Se nós nos conhecêssemos mais, desvendaríamos os nossos “segredos” e talvez ficássemos mais confiantes diante de situações que nos escapam.

 

Saber quem somos nós, como funcionamos, como e porque aprendemos, saber como e porque pensamos, porque agimos; conhecer nossa organização interna e externa; decifrar os mistérios que envolvem nosso ser não parece um objetivo fundamental, provavelmente, o mais importante da nossa existência? 

 

É verdade que tudo que se refere ao nosso organismo parece complicado. Algumas vezes, as palavras são difíceis de serem pronunciadas, compreendidas, as explicações parecem feitas somente para os estudiosos do assunto. É um verdadeiro desafio!

 

O desafio é muito maior quando se trata do cérebro. O que conhecemos sobre nosso cérebro? Muitos veem o cérebro como uma realidade estranha e diferente, um espaço onde achamos que não é possível ir. Pensamos que talvez seja melhor ignorá-lo, é mais prático, mas, o que não compreendemos é que agindo assim ficamos sem conhecer o que nos caracteriza como ser humano ou mesmo simplesmente como vivente.

 

Então, vale a pena conhecer essa história, que mesmo sendo complexa é extraordinária! O mais interessante é que essa oportunidade de conhecer nos é dada exatamente pelos especialistas que agora se tornaram visíveis, disponíveis, transdisciplinares.... Como não somos todos neurocientistas (especialistas do cérebro) vamos nos apoiar nas pesquisas que eles disponibilizam para uma melhor compreensão de nós mesmos, e ver de perto como nosso maestro, nosso cérebro é, percebe, aprende, conecta e faz.

 

Com as novas tecnologias e o surgimento desse novo “continente”, formado pelas Neurociências, é possível ver agora esse observador, observando, aprendendo, pensando, sentido, refletindo, falando, amando, sonhando... As Neurociências nos dão a oportunidade de levantar um pouquinho o “véu” desse imenso mistério do funcionamento cerebral e do grande esforço que nosso cérebro faz para manter nosso equilíbrio. É uma oportunidade única para explorar, descobrir, desvendar o que por séculos esteve somente na mãos dos especialistas.

 

Nosso cérebro pode ser comparado como um “grande maestro” que rege uma orquestra da mais alta complexidade, com uma partição e o repertório que mudam continuamente, reunindo centenas de instrumentos diferentes, para criar a mais fabulosa das sinfonias![1] A do nosso ser, regulando-se na sua relação com o meio ambiente, adaptando-se na sua relação com os Outros e evoluindo, na sua relação consigo mesmo.

 

Nosso potencial orquestrado por esse maestro:  Aproximadamente cem bilhões de neurônios quando um bebê humano vem ao mundo! Cem bilhões é enorme! O mais impressionante é que essa quantidade não acaba nesse número. Uma vez que o bebê nasce ele vai fazer proliferar conexões entre seus neurônios e quando esse humano atinge a puberdade, ele chega com uma coleção de 10 mil conexões por neurônio. Cem bilhões de neurônios e dez mil conexões para cada um deles, podemos então calcular o potencial que temos à nossa disposição: um milhão de bilhões de conexões[2].

 

O Cérebro é um sistema de conexão que calcula na mesma velocidade que a luz! Ele é o nosso órgão de aprendizagem, de comunicação e de informação. Independentemente da nossa vontade ele conecta de maneira incessante, tudo que vemos, ouvimos, tocamos, imaginamos, sentimos, sonhamos... Seu potencial é ilimitado. Segundo os neurocientistas, esses bilhões e bilhões de conexões são comparáveis à quantidade infinita de grãos de areia ou de estrelas o céu!

 

Essa estrutura biológica complexa nos proporciona uma reserva ilimitada de possibilidades, de configurações, de estados mentais que traduzem a riqueza, a diversidade e a unicidade do nosso cérebro. Não existem dois cérebros iguais em toda a humanidade[3].

 

O desenvolvimento do cérebro depende, ao mesmo tempo, da biologia e da experiência. As tendências genéticas interagem com a experiência para determinar a estrutura e o funcionamento do cérebro a cada momento. É essa interação constante que faz que cada cérebro seja único.

 

É legítimo fazer as perguntas: Por que conhecer nosso cérebro? Qual o interesse em saber como ele funciona?  O que esse assunto nos traz de concreto? Qual a importância de saber como o cérebro aprende? Por que querer saber sobre as imagens que vemos? Os sons que ouvimos? Os fenômenos que percebemos? O que esse órgão faz? Como ele funciona? O que são os neurônios ? O que são células da glia? O que é uma sinapse? O que é um impulso nervoso? O que é um neurotransmissor? 

 

É legitimo nos interrogarmos sobre nossos pensamentos, nossas emoções, nossos sonhos, nossas memórias, nossa atenção, nossas motivações, nossa comunicação, nossa consciência e uma infinidade de outros conceitos ligados obrigatoriamente a esse órgão que passa, de uma maneira geral, despercebido.

 

Quando os especialistas que estudam o cérebro nos mostram alguns elementos com esses nomes evocadores, ficamos pasmos diante desse conhecimento que nos escapa e ficamos ainda mais surpresos em realizar que esse órgão fantástico faz parte integrante do nosso corpo, é responsável pela nossa vida, rege nossa existência, mas, agimos como se isso fosse somente assunto para especialistas.

 

O que existe no interior do nosso crânio?! Vamos “fechar” os olhos, e nos voltar para Observador que tudo observa, vamos direcionar o nosso olhar para essas camadas “desconhecidas” dentro de nós. Espaços íntimos, no âmago de nós mesmos, lá onde o mistério está ancorado como uma nave cheia de passageiros, com nomes singulares.

 

Para facilitar a nossa aprendizagem vamos utilizar a técnica da viagem imaginária ou sonho acordado. A viagem imaginária é uma ferramenta valiosa que nos permite ir lá onde nos parece impossível ir. Essa ferramenta nos permite fazer uma experiência, pessoal e significativa, de uma realidade que nos escapa. Por exemplo: a circulação sanguínea, o metabolismo da célula, o cosmos, o interior de uma planta, aqui no nosso caso, dentro da nossa cabeça.

 

As palavras que são usadas para nomear alguns elementos, algumas áreas, algumas estruturas, algumas funções nesse “lugar” extraordinário que é dentro do nosso cérebro, são muitas vezes, surpreendentes e até mesmo engraçadas. O hipocampo, o hipotálamo, tálamo, amidalas,  corpo caloso, células nervosas etc. Às vezes são nomeadas até com nomes de pessoas: área de Broca, área de Wernick, nódulo de Ranvier, células de Schwann, fissura de Sylvius, fenda de Rolando etc.

 

Vamos conhecê-lo! É mais do que importante, simplesmente, porque quando deixamos nas mãos dos outros o que é nosso e da nossa responsabilidade, nós corremos o risco de perder algo muito precioso: nossa autonomia. Exemplos são múltiplos: nossa saúde que deixamos nas mãos dos especialistas, nossa aprendizagem que deixamos nas mãos da instituição educacional, nossa responsabilidade social e ética que deixamos nãos mãos dos políticos, nosso sagrado que deixamos nas mãos de padres, pastores, gurus, detentores de dogmas que estão sempre com receitas prontas para vender! e acabamos ficando confinados nos pronto-para pensar, pronto-para fazer, pronto-para dizer e no pior de todos no pronto-para crer.

 

Se, por um lado, o cérebro é minuciosamente observado, estudado, pesquisado em um ritmo acelerado pelos especialistas, por outro, infelizmente, ele ainda não parece fazer parte das grandes preocupações da maioria dos humanos.

 

Com tecnologias que estão criando uma quantidade enorme de ferramentas para “facilitar” nossa vida, precisamos com urgência, tomar consciência da necessidade de conhecer nosso cérebro, conhecer quem somos nós, para poder construir nossa autonomia e poder ficar no comando da nossa história.

 

Vamos então observar o grande maestro de perto. Ele é tão grande quanto céu, como dizia a poetisa Emily Dickson, porque colocados lado a lado um contém o outro.

 

Até o final dos anos setenta, a exploração cerebral era possível através, essencialmente, dos raios X, descobertos em 1895 por Wilhelm Roentgen (físico alemão), a radioatividade natural descoberta em 1896 por Henri Becquerel (químico francês) e a radioatividade artificial descoberta em 1934 por J. F. Joliot et Irène Curie (químicos franceses).

 

A partir de 1929 o eletroencefalograma de Hans Berger (neurologista alemão) registrou a atividade elétrica global de bilhões de neurônios do cérebro. Em seguida, nos anos 40, Wilder Penfield (neurocientista canadense) explorou o córtex, utilizando eletrodos.

 

A década de noventa é considerada como a década do cérebro. Praticamente, todos as disciplinas se voltaram para o estudo desse órgão. A pergunta é: então, por que esse conhecimento nos escapa ?

 

Quando os neurocientistas falam do cérebro, eles usam de preferência a sigla SNC para nominá-lo. SNC significa Sistema Nervoso Central, incluindo o cérebro propriamente dito e a medula espinhal.

 

O cérebro fica dentro da cavidade craniana. É um órgão bem protegido, como o bebê que fica nove meses no líquido amniótico e protegido por uma membrana, o cérebro fica a vida inteira imerso no líquido cefalorraquidiano e coberto por três membranas, chamadas de meninges.

 

Esse órgão é um grande consumidor de oxigênio. Ele é atravessado por um grande número de vasos sanguíneos. Sozinho, ele consome  20% do oxigênio do nosso organismo, ou seja 0,8 litro de sangue por minuto. Na verdade, como diz Jean Didier Vincent (neurobiologista francês), o cérebro é o órgão mais vascularizado do nosso organismo, nenhuma célula nervosa se encontra afastada de mais de um meio centésimo de milímetro de um capilar sanguíneo[4]

 

Assim como o nosso planeta Terra tem dois hemisférios, norte e sul,  nosso cérebro é constituído de dois hemisférios só que em vez de norte e sul é, direito e esquerdo conectados por um feixe de, provavelmente, 300 milhões de fibras, chamado corpo caloso. A linguagem do corpo caloso é de aproximadamente 4 milhões de mensagens por minuto! Para informação, essa forma de conexão parece ser utilizada preferencialmente pelos canhotos. No mundo feito para destros é indispensável informar os interessados que ainda recebem uma etiqueta que os incomodam!!![5]

 

O nosso cérebro é composto de células nervosas. As principais são os neurônios e as células da glia. Segundo os neurocientistas, como já falamos, nós temos, aproximadamente 100 bilhões de neurônios e aproximadamente 120 bilhões de células da glia, constituindo uma imensa rede de conexões dinâmicas que evoluem constantemente para integrar nossas experiencias de vida e nossas aprendizagens. Isso nos dá uma ideia da dimensão espetacular do nosso potencial.

 

Neurônios e células da glia, irmãos para todo instante, fazem milhões e milhões e milhões de conexões, trabalhando dia e noite, em função da informação e da comunicação para obter o mais precioso dos bens: nosso equilíbrio na verticalidade do nosso Ser.

 

Conhecer esse extraordinário!!!!! potencial, essa riqueza sem contrapartida real deveria fazer parte dos nossas atividades principais. A gestão do nosso potencial e do bem-estar humano não deveria ser a prioridade de todos?

 

Não é por acaso que os gregos gravaram a frase “Conhece-te a ti mesmo e conhecerás os deuses e o universo” na entrada do Templo de Delfos, em homenagem a Apolo, o deus grego do sol, da harmonia e da beleza.

 

O próprio cérebro humano, voltando-se para o mundo dos átomos e dos núcleos, descobre  que ele faz parte da natureza dinâmica do Universo. Compreendemos, então, que tudo está conectado! Tudo é interdependência!

 

Para conhecermos o que está à nossa volta, interagir com o mundo e com os Outros precisamos, antes de tudo, conhecer quem somos nós. Este é o verdadeiro conhecimento!

 

Paul VALÉRY, escritor francês uma vez tentou escrever uma fabula paródica sobre o cérebro, porém, escreveu somente os dois primeiros versos que falava assim :

 

"Mestre Cérebro, em sua árvore empoleirado

Mantinha em suas dobras seu mistério"...

 

Foi preciso séculos para reabrir o estatuto de observador do Mestre Cérebro. Não somente ele ainda mantém em suas dobras seu mistério, mas ele continua, para muitos, empoleirado,  inacessível. Nossa civilização está cheia de paradoxos. Em nossa época achamos normal administrar tudo... exceto os recursos do cérebro!

 

Leitura da Vida e do Vivente! Leitura do mundo! É o que pretendemos abordar aqui. Esperamos que esta primeira página seja o começo de uma longa e extraordinária história para todos nós!

 

Aprender e procurar compreender é o melhor estímulo biológico para o cérebro!

 


[1] Oliver Sacks, 2003.

[2] O mundo, segundo Albert Jacquard, (Conferência em Vanosc-Ardêche, Jean Dornac, Jun 2004). http://www.ethologie.info/revue/spip.php?article15

[3] H. Trocmé-Fabre, 2002.

[4] Cf. Jean Didier VINCENT (1986). 

[5] Howard GARDNER, 1974, citado por H. Trocmé-Fabre, 2002.


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